PEC 241 parte do princípio de que se a economia não permitir, a população não irá adoecer… nem envelhecer

Via de regra, escritórios de assessoria de comunicação me enviam, a título de colaboração, artigos e comentários de profissionais abrangendo temas diversos. Não me lembro de ter me detido em algum, particularmente. Mas este artigo do especialista na área de saúde David Stacciarini, sócio e diretor jurídico do aplicativo Docway, impressionou-e muito bem e eu gostaria de compartilhar com vocês. Vem a calhar e merece ser lido. Vamos a ele:

  A PEC 241 E O FUTURO DA SAÚDE NO BRASIL

David Stacciarini

“Uma vez aprovada a nova regra, caberá à sociedade, por meio de seus representantes no parlamento, alocar os recursos entre os diversos programas públicos, respeitando o teto de gastos. Vale lembrar que o descontrole fiscal a que chegamos não é problema de um único Poder, ministério ou partido político. É um problema do país! E todo o país terá que colaborar para solucioná-lo.” Assim termina a proposta da PEC 241 feita pelo ministro da Fazenda, Henrique de Campos Meirelles, e pelo ministro do Planejamento, Dyogo Henrique Oliveira.

O Conselho Deliberativo da Fiocruz, a Fundação Oswaldo Cruz, instituição estratégica do Estado para a ciência e a tecnologia em saúde, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a Rede Brasileira de Escolas de Saúde Pública (RedEscola), as secretarias de Saúde de inúmeros municípios e estados, professores de Medicina de inúmeras universidades respeitadas no Brasil, bem como o próprio ex-ministro da saúde, José Gomes Temporão, vetam a aprovação da PEC 241/16. Mas por qual motivo?

A Proposta de Emenda à Constituição 241/16 não tem como objetivo salvar a economia? Ocorre que austeridade na saúde não é novidade, tal medida já ocorreu em outros países, e inclusive foi alvo de inúmeros estudos internacionais, um deles famoso trabalho realizado pelo pesquisador David Stucler, de Oxford, conhecido como Multiplicador Fiscal. Mas, o Governo Federal Brasileiro realiza uma reflexão importante, e todos podemos concordar que isso é o ideal em uma nação, ao propor que seus gastos não sejam maiores do que recolhe em tributos e impostos. Porém, o mesmo raciocínio não se aplica ao setor de saúde, área em que há algo inevitável, imutável e que não pode ser controlado: o envelhecimento da população. Tal elemento não está sendo colocado na equação da PEC 241.

Pois as doenças não aparecem em uma economia favorável ou desfavorável, elas não são concursos públicos, criados de acordo com a necessidade do estado. Independendo dos fatores econômicos ou políticos, as doenças aparecem sempre, não importa o tamanho de sua economia ou de sua nação. O que muitos estudos vêm apontando, inclusive para maior desgosto do estado, é que é nos países em recessão econômica que mais se manifestam as doenças e os surtos mais ocorrem.

O Brasil possui um sistema de saúde universal replicado do modelo britânico (NHS- National Health Service). Apesar de oferecermos um sistema semelhante de saúde, é muito difícil para o Brasil acompanhar o modelo clonado, uma vez que nosso orçamento é cinco vezes menor do que o da Inglaterra. Infelizmente, diferente de outras áreas, não é possível estabilizar um valor para a saúde, justamente devido à população estar sempre adoecendo. Viver e morrer é destino da vida de todo homem. Todos os países do mundo vêm aumentando, com o decorrer dos anos, o percentual do seu orçamento no setor de saúde.

Como já esclarecemos, a população envelhece e novas doenças aparecem. Um estudo levantado afirma que, em 20 anos, a população idosa irá dobrar. Isso implica em doenças crônicas, degenerativas, do coração, em vários tipos de câncer. E essa é a preocupação de todos esses especialistas em saúde acima citados. A PEC 241 funcionaria muito bem em outros setores, mas é uma arma perigosa que coloca em risco o setor de saúde.

Se você trava o aumento do orçamento de saúde ou impõe seu crescimento conforme a inflação nos próximos 20 anos, como está proposto, o governo pressupõe que gastamos muito em saúde não porque a população necessita, mas porque a economia permitiu, pois, o tratamento das doenças dessas pessoas só ocorreu porque havia dinheiro acima da inflação e do planejado. Contudo, se agora a economia não permitir mais, ou não permitir que dinheiro que não seja planejado anteriormente seja entregue, logo a população não irá mais adoecer.

É um raciocino errado com aparência de verdadeiro, uma falácia. Ninguém acredita que o governo está fazendo isso para prejudicar a vida das pessoas, ocorre que houve a ausência de debate com especialistas no setor de saúde, bem como não foi realizado ou sequer solicitado um estudo para averiguar as consequências em longo prazo.

Este é o grande impasse, especialistas de saúde apontam uma prioridade, especialistas em economia apontam outra e você se pergunta: qual problema devemos resolver primeiro?

 

3 ideias sobre “PEC 241 parte do princípio de que se a economia não permitir, a população não irá adoecer… nem envelhecer

  1. Muito bom.
    Faz total sentido, acredito que o autor quis passar a ideia que os pacientes irão continuar aparecendo, e o problema que o dinheiro não ira aumentar.
    Facil matematica, se voce tem x:100 para tratar p:10 pessoas, ano de 2017, e em 2018 voce tem x: 110 (valor corrigido com inflação) só que agora voce nao tem p:10 mas p:20, voce tem o dobro de pessoas porém nao o dobro do orçamento, como resolver?. Por isso ele disse que a PEC é boa com a exceção da saúde, pois a doença é inevitavel, não depende de cargos publicos…
    Gostei, parabens

  2. Sábias palavras. Eu resumiria dizendo que a PEC 241 é mais um ato de desumanização de nossa sociedade cada vez com bases consolidadas em tecnologia e cientificismo (mesmo o cientificismo político).

  3. Pelo que entendi a Proposta de Emenda à Constituição 241/16, impõe um teto de gastos para o governo , que sómente será atualizado pela inflação do ano anterior. Não percebo que atingirá o atendimento à saude. É conhecimento comum que o estado brasileiro tem uma camada de gordura de gastos muito grande. O que os especialistas estão comentando é que um limite de gastos será imposto, se o orçamento em determinado segmento for insuficiente, será retirado de outra área. O que não é mais possível é se recorrer a aumento de impostos. Reduza-se por exemplo o tamanho do Legislativo, com a extinção de milhares de cargos comissionados de utilidade duvidosa. Essa é uma análise óbviamente superficial, mas é o caminho que entendo a ser seguido.

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