A curiosa coincidência que envolve a embaixatriz da Grécia Françoise Amiridis em tragédias com assassinatos de estrangeiros

Antes de lerem a crônica abaixo, peço a atenção aos leitores para algo atípico: o fato de Françoise, mulher do embaixador Kyriakos Amiridis, estar curiosamente ligada a dois crimes terrivelmente violentos, ocorridos no espaço de 12 anos, no Rio de Janeiro, envolvendo estrangeiros.

Em 2004, o caseiro que confessou ter assassinado o casal de americanos Staheli, ele o executivo da Shell, Todd Staheli, foi preso saindo da casa de Amiridis, flagrado pela câmera da segurança pulando o muro. Na ocasião, a consulesa, cujo nome não foi então revelado à imprensa*, disse que o caseiro invadiu seu quarto munido de uma faca, depois de ter roubado 20 reais na cozinha, e a acordou quando deixou cair uma moeda no chão. Ela teria pedido educadamente que ele se retirasse, e ele a teria obedecido. Preso, o caseiro acabou confessando o assassinato, um mês antes, do casal vizinho, para o qual havia trabalhado, passando a trabalhar para outro morador, Paulo Malta. Ele justificou o crime por motivo de “racismo”, não convencendo a ninguém, pois outros empregados negros serviam ao casal Staheli sem sofrerem preconceito. Um crime mal explicado.

Até então, ninguém sabia que o cônsul Amiridis era casado. Ele era tido como solteiro por toda a sociedade carioca e, ao longo dos quatro anos em que serviu na cidade, de 2001 a 2004, foi o bachelor oficial dos jantares elegantes,  compondo as mesas de lugares marcados, escoltando senhoras e jovens senhoras desacompanhadas. Muitas tentaram namorá-lo, porém sem sucesso. Não podiam supor que ele já estivesse casado, como agora sabemos estar há 15 anos, praticamente desde que chegou ao Brasil. Elegantemente, Kyriakos não dava esperanças a elas. Era um homem fiel a Françoise.

*http://revistaquem.globo.com/Revista/Quem/0,,EMI43547-9531,00-ACUSADO+DE+MATAR+O+CASAL+STAHELI+MOSTRA+COMO+EXECUTOU+O+CRIME.html

O diplomata grego Amiridis era um amigo de muitos anos. Meu e de amplo círculo social carioca. Agradável, sociável e extremamente simpático, seu smoking frequentou os bons salões do Rio – do Cosme Velho, de Lily Marinho, ao edifício Golden Gate, de Idinha Seabra Veiga, dos elegantes jantares de lugares marcados de Angélique Chartouny, aos de Beth e Carlos Alberto Serpa. Ele praticamente testemunhou, como um dos protagonistas, o “canto do cisne” da alta vida social da cidade, quando esta colunista ainda noticiava anfitriões de jantares black-tie à francesa, que marcavam lugares à mesa. Hoje, raridade.

Foi praticamente às vésperas de sua remoção do Rio de Janeiro para outro cargo que sua casa na Barra da Tijuca foi invadida por um assaltante, funcionário de casa do condomínio, que ao ser preso confessou o assassinato do casal Staheli, caso horripilante e rumoroso. A mídia noticiou, porém nem todos leram e souberam que Kyriakos era casado.

O estimadíssimo Kyriakos era moldado para a carrière, um multiplicador e “estreitador” de laços. Nos anos em que esteve ausente do Brasil, manteve contato com os amigos que fez no Rio de Janeiro. Até que, em 8 de janeiro passado, recebi de Atenas esta mensagem formal abaixo do diplomata: 

“Prezada Senhora Hilde,

Em primeiro lugar, espero que este meu e-mail  vos encontre  bem, com saude e que tudo esteja indo conforme desejais em vossa vida.
Venho por meio desta me comunicar com V.Sa para levar ao vosso conhecimento que em meados de Janeiro de 2016, estarei assumindo o cargo de Embaixador da Grecia no Brasil.
Creio que vos compreendeis a satisfacao e a alegria que me proporciona o fato de retornar, em novo cargo, num pais, com o qual me unem lindas memorias como tambem fortes amizades com pessoas especiais como V.Sa.
Espero que terei a oportunidade de vos encontrar logo novamente.

Atenciosamente,

Kyriakos Amiridis”

Em seguida, enviei a resposta:

“Caro Kyriakos
 
Seus amigos do Rio de Janeiro, entre os quais Francis e eu nos incluímos, estamos muito contentes com seu retorno ao Brasil como embaixador.
Hoje, a Andrea Natal, diretora geral do Copacabana Palace, pediu-me seu email, pois quer convidá-lo para o Baile do Copa, em que a Grécia será a grande homenageada, por ocasião deste nosso Ano Olímpico.
 
Envio-lhe o link do post que veiculei em meu blog.
 
“Ex-cônsul grego Kiriakos Amiridis de volta, agora como embaixador em Brasília” http://ln.is/com.br/rTYGh
 
Abraços e com os votos de uma boa viagem
 
Hildegard”
A troca de correspondências via email prosseguiu. Vejam abaixo:

“Estimada Hilde,

Agradeço  muitíssimo pela sua calorosa mensagem de boas-vindas!
Cheguei em Brasília e já assumi minhas funções na sexta-feira, 15 de janeiro, quando encontrei o Secretário-Geral das  Relações Exteriores no Itamaraty, Embaixador Sérgio Danese, a quem apresentei as cópias das minhas credenciais como Embaixador da Grécia no Brasil!

Estou animado  com a possibilidade de encontrar voce e Francis quando estiver no Rio de Janeiro e os avisarei antecipadamente, antes da minha chegada na nossa cidade maravilhosa!

Meu número de celular é (61) XXXX XXXX

Com os melhores cumprimentos,

Kyriakos Amiridis 

P.S.
Agradeço imensamente  pela referência que fez sobre mim em sua coluna social.”
Minha resposta:

“Caro e prezado amigo Kyriakos

Francis e eu estamos muito contentes com sua presença em nosso Brasil.
Não vemos a hora de revê-lo.
Pergunto: o Copacabana Palace (Andrea Natal) conseguiu lhe falar? Caso tenha havido algum desencontro, eu gostaria de convidá-lo para meu camarote no Baile do dia 6, que homenageia a Grécia. O “Olympia Ball”, abrindo os festejos olímpicos. O embaixador da Grécia é presença fundamental.
Abraços
Hildegard”
Réplica dele:
“Cara Hilde,
 
Mais uma vez agradeço pela sua gentileza em ter-nos indicado para receber tão honroso convite da Sra. Andrea Natal e, ainda, de convidar-nos para o seu Camarote. Já tivemos sim o contato com os organizadores do Baile e os convites para mim e a Françoise já estão à nossa disposição no Copacabana Palace.
 
Ainda não sei qual o local que ficaremos no evento, mas caso tenhamos a possibilidade de estarmos juntos no mesmo Camarote, será um grande prazer para nós.
 
Abraços,
 
Kyriakos”
Meu retorno:
 
“Prezado Kyriakos
 
Certamente teremos a oportunidade de nos ver no baile. Nossos camarotes são lado a lado. Será um grande prazer estar com você e Françoise. Fico contente em saber que o contato foi feito, e o local mais adequado para o Embaixador do país homenageado certamente é o do anfitrião da festa: a direção do hotel, a querida Andréa Natal.
 
Abraços e nos vemos na grande celebração à Grécia,
Hildegard”

 

Na ocasião, no animado e lindo baile grego do Copa, conheci Françoise, a mulher de Kyriakos. Percebi que não tinha o traquejo e a postura usuais em mulheres de diplomatas ou habituadas ao convívio social. Mas foi simpática. Quando ele fez a apresentação, houve um diálogo mais ou menos assim:
“Hildegard, esta é minha mulher, Françoise. Você sabia que eu havia me casado?”.
“Sim, eu soube pela mídia, quando houve aquele assalto à sua casa, na Barra da Tijuca, e a presença da consulesa foi mencionada”.
Neste instante, Kyriakos lançou um olhar cheio de significados para a mulher. Fiquei imaginando o que ele estaria querendo dizer através daquele olhar. Não sou de registrar olhares ocorridos, sobretudo em grandes bailes de carnaval, e sequer de me lembrar deles. O olhar de Kyriakos, não esqueci. Havia algo sério por trás daquele.

 

olympia-amiridis

Exibindo as máscaras de Maria Callas, homenageada em nosso camarote no Olympia Magic Ball, do Copacabana Palace, esta colunista e a embaixatriz da Grécia, Françoise Amiridis, indiciada como suspeita no assassinato do marido, o tão estimado da sociedade carioca, e agora também do mundo social e diplomático de Brasília, embaixador Kyriakos Amiridis. Foi a última vez em que Francis e eu o vimos, esperávamos revê-lo neste verão carioca. 

Fotos Marcelo Borgongino

*http://revistaquem.globo.com/Revista/Quem/0,,EMI43547-9531,00-ACUSADO+DE+MATAR+O+CASAL+STAHELI+MOSTRA+COMO+EXECUTOU+O+CRIME.html

31 ideias sobre “A curiosa coincidência que envolve a embaixatriz da Grécia Françoise Amiridis em tragédias com assassinatos de estrangeiros

  1. Cara Hildegard , veja o depoimento da mãe da embaixatriz :

    “Não sei porque ela [Françoise] fez isso, ele [Kyriakos] era uma pessoa muito boa. Tratava minha neta, filha da Françoise, como filha dele”, disse a mãe da acusada.

    Rosângela contou que, à época do assassinato, a filha falou que o PM havia matado o embaixador.

    https://www.google.com.br/amp/s/noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2017/04/18/se-ela-fez-tem-que-pagar-diz-em-audiencia-mae-de-suspeita-de-matar-embaixador-grego-no-rio.amp.htm

  2. Pingback: Hildegard Angel: A mulher do embaixador grego e um outro crime de 2004 - Portal Fórum

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  4. Excelente matéria! Ainda estou chocada. Como era casada com um cidadão grego em missão diplomática, essa criatura das trevas não deveria ser deportada e julgada na Grécia? Faz as hárpias parecerem pintinhos!

    • O fato dela ser brasileira e ter praticado o crime no Brasil, não permite que ela seja “extraditada” para a Grécia, de forma que ela deverá ser julgada no Brasil. A Constituição proíbe a extradição de brasileiros natos.
      Lamentável esse crime…

  5. ESSA MULHER NÃO DEVE TER ASSISTIDO MY FAIR LADY. VI COM AUDREY HEPBURN E REX HARRISSON NO CINEMA, COM JULIE ANDREWS NO TEATRO EM NYC E COM BIBI FERREIRA E PAULO AUNTRAN NO BRASIL. UMA VENDEDORA DE FLORES CHAMADA ELIZA DOOLITLLE FALANDO UM INGLÊS POBRE COCKNEY É TRANSFORMADA EM UMA GRANDE DAMA PELO PROFESSOR HIGGINS. CHEGA A SER CONFUNDIDA NUMA FESTA COMO SENDO DA FAMÍLIA REAL HUNGARA. MAS ESSA EMBAIXATRIZ DE DE NOVA IGUAÇU JAMAIS DEIXOU DE SER NA VERDADE UMA… NÃO EXTIRPOU O RANÇO DE ONDE SAIU. JÁ O EMBAIXADOR MOSTROU UMA BÉLISSIMA FIGURA QUE AMAVA SUA COMPANHEIRA. VAMOS COMBINAR. VIR PASSAR AS FÉRIAS NO RIO E COMPRAR UM PEQUENO APARTAMENTO AO LADO DO CASEBRE DA SOGRA É UM POUCO OVER. GARANTO QUE O PROFESSOR HIGGINS NÃO FARIA ISSO.

  6. O teu olhar de lince não poderia deixar de registrar uma certa estranheza naquele momento da festa. Intuitivamente, percebeu o que aconteceu e o que estava para acontecer. Além da intuição feminina, também o aguçado olhar da jornalista que és não poderia deixar de traduzir aquela ao lado do saudoso embaixador. Um pequeno detalhe em uma festa expôs de forma sutil e breve a escuridão que havia por trás do brilho da então senhora acompanhante Françoise.

  7. Prezada Hildegard
    Que texto delicioso repleto de dados, fontes, links entre histórias que pareciam díspares. Uau. Uma boa trama, um bom roteiro para um audiolivro. Uau. Trama, amor, sexo, poder, roubo, altas rodas, Olimpo, assassinato, mentira, mídia, espetacularização midiática, relações internacionais. Uau.
    E você, como sempre, magistral. Uma griot que nos envolve com este emaranhado de idas e vindas, e nos dá uma possibilidade plausível de trilha. O gostinho do quero mais esta ativado: e agora, Hilde? quem matou, mandou matar e por que? O mordomo esta fora…

  8. Parabéns! Excelente texto o qual já comuniquei ao casal de consules da Gra Bretanha em Belo Horizonte. Esse caso de 2004 agora precisa ser reaberto. (Hilde, te conheci em Brasília lá por volta de 1980, vc não deve se lembrar de mim, sou sobrinho do Alceu, Camilo, Vera e Narcisa Penna, bom ano novo!)

  9. Uma ótima jornalista e, acima de tudo, repórter, faz uma matéria dessas. Sua contribuição pode, até, ajudar na defesa da imagem do Embaixador. Sua mulher chegou a dizer que era agredida por ele. Seria verdade? E isso justifica mandar matá-lo? Muita coisa ainda vai aparecer quando os culpados começarem a brigar… Aguardemos!

    • E aí, Elizabeth, qual é a sua dúvida? O que você depreendeu da matéria, além da mera exposição dos fatos?

      • notadamente hildegard o embaixador não fez boa escolha, pelo menos pelo que é veiculado. Mas tanta polidez… e escondendo fatos de sua vida…… nos leva a crer em uma distorção da realidade.Há pessoas que são seda pura socialmente…. só os de casa sabem o que enfrentam! Suposições…suposições, não posso afirmar…tem muitos fatos a apurar e eu não tenho nada com isto….mas…

  10. Prezada Hildegard,
    A sua surpresa também foi a minha. Quem conheceu Kyriakos foi agraciado com sua cordialidade, simplicidade, inteligência e, sobretudo, com seu amor ao Rio de Janeiro, ininteligível até a nós, cariocas, mas agora esclarecido. O melhor Cônsul, que unificava a Comunidade com excelência e ensinava a importância da diaspora. Fim incompatível, perda enorme, dor imensurável a todos nós.
    Atenciosamente,
    Lívia.

  11. Que história, hein! Se a polícia decidir rever o crime de 2004, provavelmente, irá encontrar as digitais da embaixatriz. Parabéns pelo impecável texto, Hilde!

  12. essa sessao de correspondencia, deveria ir para a historia! quero morrer e nao quero amigos como os que ai estao! todos circularam nos ambientes com embaixador e triz, e enquanto lhes interessou era tudo maravilhoso. agora, a suspeita ainda nem foi julgada, e pasme, olha o tribunal da inquisicao solto! eu hem…..

    • Todos os leitores e eu também manifestamos grande apreço e consideração pelo embaixador Kyriakos Amiridis, grande diplomata, figura humana notável, séria, preciosa. Quanto à embaixatriz, que eu saiba ninguém circulou com ela entre seus amigos no Rio de Janeiro, onde foi vista uma única vez, este ano, num baile de carnaval. Marina, leia os posts antes de emitir julgamentos

    • Que Tribunal de inquisição, você, encontrou aqui? Porque eu, não encontrei nenhum. E apesar da Embaixatriz ainda não haver sido julgada, segundo o que venho lendo nas notícias sobre este caso é, que, parece haver grande indício de sua culpabilidade, na morte do marido(Embaixador); quando um dos presos, suspeito por participação no assassinato diz, que ela, lhe prometeu 80.000R$, pelo assassinato do marido.

  13. Querida Hildegard, eu não conhecia seu blog, mas cheguei até você pela menção ao seu texto que foi feita no R7.com.
    Eu não acredito em coincidências no crime, principalmente nesses que não são muito bem explicados; de fato, a motivação no caso Shell ficou um pouco estranha e agora a embaixatriz também deu uma motivação estranha de que ela apanhava do embaixador.
    Espero que tudo seja apurado e que a verdade apareça por completo.
    Abraço,
    Elaine

    • O único depoimento que posso dar é que o embaixador Amiridis era um homem extremamente bem educado, cordial, amigável, e jamais demonstrou, nos quatro anos de convívio social, um temperamento violento ou agressivo.

  14. WWWOOOOOOOWWWWW…. QUE TEXTO, HILDE !!!!

    UM ROTEIRO CINEMATOGRÁFICO, DE BELEZA E HORROR…

    TEXTO DE MESTRE, QUERIDA !!! BJS !!!!

  15. Hilde que história!!! E que texto vc nos deu de presente, explicando os envolvimentos da embaixatriz nos crimes!Aleluia têm razão, vc brilha ao escrever sobre qualquer coisa. Bjosss

  16. Meu Deus do céu, jamais imaginei que a embaixatriz tivesse envolvimento na morte do representante da Grécia no Brasil.

  17. hilde,vc continua craque. e que craque. espero que vc tenha o mesmo orgulho quando o tom jobim me disse numa mesa do plata: aleluia! vc é um craque! só que vc é melhor que eu.

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